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28 de março de 2024

Planejamento de fogos diretos - Escotilha do Comandante Nr 166

O Planejamento de Fogos Diretos (PFD) visa permitir, ao Comandante (Cmt) da fração, o máximo aproveitamento do poder de combate de seu armamento por meio da concentração ou redirecionamento de seus fogos. Nesse contexto, entende-se que um PFD eficaz terá como consequência um engajamento rápido e preciso, cujos reflexos serão maior eficiência no consumo de munição e menor exposição dos MEM ao inimigo, além de maior letalidade.

Na literatura brasileira, tanto o Caderno de Instrução “o Pelotão de Carros de Combate – 1ª parte” (CI 17-30/1) quanto a Nota de Aula - Técnica de Tiro da VBC CC Leopard 1A5 BR, do CI Bld, elucidam ferramentas que auxiliam a designação e transferência de objetivos, como: o processo do relógio; o Ponto de Referência de Alvos (PRA) e o método da divisão de setores. Entretanto, aquelas fontes de consulta se restringem às operações defensivas, não abordando o PFD em Operações Ofensivas (Op Ofs), senão em um contexto de base de fogos. Já o CI “Pelotão de Carros de Combate – 2ª parte” (CI 11.475), publicado em agosto de 2023, trouxe maior profundidade ao assunto ao expor novos métodos como, por exemplo, o do quadrante.

Destarte, pode-se inferir que, em uma Op Ofs, a decisão do engajamento de alvos e sua execução seriam resultado à maneira como o inimigo se apresenta na zona de ação. À força dessa hipótese, é possível afirmar que ocorreria o múltiplo engajamento de um mesmo alvo (overkill); aumento do consumo de munição e uma priorização errônea de alvos.

Face à problemática exposta, o presente artigo busca identificar a importância do PFD em uma Op Ofs e exemplificar métodos de designação e transferência de alvos que teriam aplicabilidade naquele contexto.

Características das operações ofensivas

O Manual de Campanha EB70-MC-10.223 define as Op Ofs como operações terrestres de cunho agressivo, alicerçadas sobre o movimento, a manobra e a iniciativa. Elas têm por objetivo destruir (ou neutralizar) as forças do inimigo (Ini) ou conquistar acidentes capitais por meio da concentração do poder de combate superior, sincronizado no espaço e tempo decisivos.

As Op Ofs estão organizadas em cinco tipos: marcha para o combate; reconhecimento em força; ataque; aproveitamento do êxito e perseguição. Em uma sequência lógica, elas buscam respectivamente: obter ou restabelecer o contato com o inimigo; adquirir informações, revelar e testar o dispositivo e o valor do inimigo; derrotar, destruir ou neutralizar o inimigo; ampliar ao máximo as vantagens obtidas no ataque, enquanto anulam a capacidade do inimigo de reorganizar-se ou realizar um movimento retró grado ordenado e cercar e destruir uma força inimiga que está em processo de desengajamento do combate ou tenta fugir (BRASIL, 2017).

Na doutrina do Exército Brasileiro, as Op Ofs devem ser executadas por forças potentes e altamente móveis, que atuam sobre o flanco e a retaguarda do inimigo. Portanto, graças à sua proteção blindada, ao seu poder de fogo e à sua mobilidade, as tropas blindadas são as mais aptas a realizar Op Ofs por meio do emprego combinado Carro de Combate – Fuzileiro, além de elementos de apoio.

Se, por um lado, as Op Ofs são necessárias para obtenção de resultados decisivos, por outro lado, elas expõem a força atacante aos obstáculos; ao fogo direto e à artilharia do Ini. Esses riscos são parcialmente atenuados pelo emprego dos princípios da guerra da massa; da manobra e da surpresa. Em adição, ressalta-se que as evoluções tecnológicas e mudanças psicossociais vividas no século atual têm modificado a forma de se conduzir a guerra.

A 2ª Guerra Nagorno-Karabakh, em 2020, e o atual conflito ucraniano-russo têm evidenciado a ampla utilização de sistemas de aeronaves remotamente pilotadas (SARP) e sistemas de munições remotamente pilotadas (SMRP), sistemas de georreferenciamento para condução de tiro e a crescente participação de agentes não-estatais no combate. Todos esses fatores agravam os riscos do atacante e exigem um aumento no ritmo das operações a fim de propor múltiplos dilemas ao Ini e desestabilizá-lo, além do correto emprego de cada armamento visando maximizar seu poder de combate.

Em adição, é valido destacar o testemunho Miller e Averna à Armor’s Magazine (Jan-Fev 1994, p. 15):

Comandantes planejando operações ofensivas raramente têm o luxo de conduzir um reconhecimento aproximado no objetivo; eles não podem caminhar pelo solo ou atribuir PRA. O desafio nas Op Ofs é coordenar e distribuir os fogos da fração, quando em movimento, contra um inimigo, geralmente, está tico. Além disso, o PFD deve maximizar os princípios do fogo direto e permitir que o Comandante distribua, concentre e desloque os fogos de sua fração.

As técnicas para designação e transferência de objetivos permitem à guarnição das Viaturas Blindadas de Combate (VBC) atribuir, para seu Atirador (Atdr), uma ameaça detectada no menor tempo possível. Além disso, elas facilitam a coordenação de fogos da fração já que proporcionam ao Cmt ferramentas para concentrar ou redirecionar os fogos de seu armamento orgânico.

Técnica do relógio: A técnica do relógio divide a Zona de Ação em 12 partes iguais e orienta-as de forma que a posição 12 horas corresponda à frente da viatura. A partir daí, os alvos são designados conforme se apresentam dentro do relógio, por exemplo, “Contato! Tropa – 4 horas!”.



A técnica do PRA utiliza pontos nítidos à frente da fração para rapidamente direcionar os fogos orgânicos. Os PRA podem ser orientados tanto pelo terreno (a situação mais usual) quanto pelo inimigo; dessa maneira, enquanto essa orientação emprega destroços de viaturas, formações inimigas ou posições defensivas como PRA, aquela utiliza acidentes como cortes de rio, entroncamentos, pontes ou regiões matosas. É possível, também, criar PRA com painéis térmicos ou sinalizadores a fim de orientar os fogos em regiões com poucos pontos nítidos.

Durante a fase do planejamento, o Cmt irá identificar possíveis PRA à luz dos fatores da decisão e análise do material disponível. Para que os PRA atinjam seu objetivo, é mister que eles sejam visíveis pelo canais diurno e termal do aparelho de pontaria em uso, que sejam conhecidos por todos os integrantes da fração e, se possível, visíveis de todas as posições, para permitir o apoio mútuo entre as VBC. Também é desejável que estejam dentro do alcance dos armamentos da fração.


A técnica da divisão em quadrantes é caracterizada pela divisão da Zona de Ação em setores por meio da sobreposição de duas linhas imaginárias perpendiculares; em consequência, há a separação da área em largura e profundidade. Assim como a técnica do PRA, a divisão em quadrante pode ser feita sobre pontos nítidos do terreno ou sobre o inimigo. No primeiro caso, as linhas imaginárias se apoiam sobre um ponto nítido do terreno (ou um PRA); no outro, elas são orientadas de acordo com a direção do movimento inimigo.

Os quadrantes divididos serão nomeados conforme as Normas Gerais de Ação (NGA) da fração, geralmente obedecendo a sequência de cima para baixo e da esquerda para a direita. Nessa técnica, a designação dos alvos é realizada em virtude do quadrante em que ele se encontra seguida por sua designação. Por exemplo: “Contato! Q2 – CC!”. Quanto às desvantagens, ressalta-se que, assim como na técnica do relógio, o diferente posicionamento dos observadores pode ocasionar um erro em direção por ocasião da emissão do comando de tiro.


Destaca-se que é possível orientar a técnica dos quadrantes de acordo com a direção de deslocamento das forças amigas ou coincidir as linhas imaginárias sobre o Cmt da fração.

Nesse caso, o mais indicado para as ações dinâmicas, o dispositivo amigo é dividido em quatro setores de aproximadamente 90° (eles são: à frente e à esquerda; à frente e à direita; à retaguarda e à esquerda; à retaguarda e à direita), distribuindo-os a cada um dos elementos subordinados é encarregado de um setor a fim de manterem a segurança e observação contínua.



A atribuição de setores aos subordinados também contribui para ganho de consciência situacional e para evitar o fratricídio. No primeiro caso, a divisão deixa claro quem é o responsável por realizar o informe oportuno sobre atividades importantes (fogos de artilharia, refugiados, movimentação de forças amigas, etc.) em determinada faixa do terreno; no segundo, ela restringe o fogo no setor ao elemento encarregado dele.

Além disso, considerando o fato de o Cmt ser o centro do quadrante, os problemas de orientação são reduzidos. Em consequência disso, o Comando e Controle é facilitado, já que o comandante da fração pode rapidamente determinar uma nova direção geral de movimento ou atribuir um alvo a seus subordinados.

Conclusão

Com base no que foi apresentado, é possível concluir que os eventuais benefícios sã o superiores ao risco potencial. Apesar disso, face à s mudanças atuais do campo de batalha, o perigo tem aumentado, o que demanda que o atacante, mesmo em movimento, possa distribuir, concentrar e deslocar os fogos de sua fração em alvos geralmente abrigados. Haja vista suas características, as tropas blindadas são as mais aptas para emprego nesse tipo de operação.

A publicação atual apresentou novas técnicas para designação e transferência de objetivos, que visam facilitar a concentração e ou redirecionamento dos fogos da fração por meio do emprego de medidas de coordenação e controle específicas (PRA, quadrantes, etc). Essas técnicas podem ser orientadas de acordo com o terreno, inimigo ou forças amigas.

Quanto às suas principais desvantagens, pode-se citar o erro em direção criado pelo diferente posicionamento dos observadores e a vontade própria do inimigo, o que dificultam a utilização dos métodos centrados no terreno ou no Ini; em adição, ressalta-se que, além do caráter dinâmico das Op Ofs, nelas, nem sempre será possível realizar reconhecimentos ou ensaios na Zona Ação. Nesse contexto, o emprego da técnica do quadrante centrada no Cmt surge como uma alternativa viável, desde ela componha o repertório de procedimentos operacionais padrão da fração.

Por fim, ressalta-se que não há uma receita mágica para o sucesso, pois a melhor técnica de combate deverá ser escolhida à luz dos fatores da decisão. Além disso, ratifica-se a importância do PFD nas Op Ofs como ferramenta multiplicadora do poder de combate da fração, pois ela possibilita o engajamento mais rápido do Ini, proporciona menor consumo de munição e, ainda, evita o fratricídio.

Referências

BRASIL. Exército Brasileiro. Comando de Operações Terrestres. CI 17-30/1: O Pelotão de Carros de Combate - 1ª Parte. Edição experimental. Brasília, 2006.

BRASIL. Exército Brasileiro. Comando de Operações Terrestres. EB70-MC-10.223: Operações. 5 ed. Brasília, 2017.

BRASIL. Exército Brasileiro. Comando de Operações Terrestres. EB70-MC-10.336: Processo de integração terreno, condições meteorológicas, inimigo e considerações civis – PITCIC. Brasília, DF, 2023.

BRASIL. Exército Brasileiro. Técnica de tiro da viatura blindada de combate carro de combate (VBCCC) Leopard 1 A5 BR [nota de aula experimental]. Centro de Instrução de Blindados. Santa Maria, RS. 2010.

BRASIL. Ministério da Defesa. Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas. MD33-M-02: Manual de abreviaturas, siglas, símbolos e convenções cartográficas das Forças Armadas. 4 ed. Brasília, 2021.

ESTADOS UNIDOS DA AMÉ RICA. Department of the Army. ATP 3-20.15 MCRP 3-10B.1: Tank Platoon. Washington, DC, 2019.

MILLER, Derek; AVERNA, Rick. Direct fire planning - Part I. Armor, Fort Knox, v. 102, n. 6. 1993.

MILLER, Derek; AVERNA, Rick. Direct fire planning - Part II. Armor, Fort Knox, v. 103, n. 1. 1994.

PIMENTEL, A. C. M. G. A. Emprego de fogos diretos no ambiente operacional contemporâneo: uma aná lise à luz da doutrina militar terrestre [dissertação]. Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais. Rio de Janeiro. 2017.


AÇO, BOINA PRETA, BRASIL!

PEDRO HENRIQUE R. KNIPPEL DO CARMO – Cap
Cmt Esqd C Ap do CI Bld

ALEXANDRE CHECHELISKI – Ten Cel
Cmt do CI Bld 

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