Nuvens
pesadas pairam sobre a Península da Coreia. Diante das declarações beligerantes
e dos testes regulares de mísseis da Coreia do Norte, bem como dos exercícios
navais dos Estados Unidos e da Coreia do Sul, o mundo inteiro teme que a
situação evolua em breve para uma nova Guerra da Coreia.
Análise:
A complexa equação chamada Coreia do Norte
O
presidente dos EUA, Donald Trump, alertou para o risco de "um grande
conflito" com a Coreia do Norte por conta das ambições nucleares do país
asiático. Em entrevista à agência de notícias Reuters no Salão Oval, nesta
quinta-feira (27/04), Trump se disse disposto a resolver a crise de forma
pacífica, possivelmente por meio de novas sanções econômicas, embora a opção
militar não esteja descartada. "Existe a chance de acabarmos num grande,
grande conflito com a Coreia do Norte", afirmou. "Adoraríamos
resolver as coisas diplomaticamente, mas é muito difícil."
Na
semana passada, o vice-presidente Mike Pence fez um discurso a bordo do
porta-aviões USS Ronald Reagan, estacionado no Japão, e disse que a
"espada está afiada" ao advertir a Coreia do Norte para não testar a
determinação militar dos EUA. Ele afirmou que os americanos responderão com
"força esmagadora" caso sejam atacados.
Poucos
dias depois, em resposta aos exercícios navais nipo-americanos no Mar das
Filipinas, o jornal oficial do regime norte-coreano, Rodong Sinmun, ameaçou:
"Nossas forças revolucionárias estão prontas para afundar um porta-aviões
americano de propulsão nuclear com um golpe só."
Tensão
crescente
Os
recentes acontecimentos não mudaram o status quo da crise coreana, mas há uma
tensão crescente que não deve ser subestimada. A capacidade militar da Coreia
do Norte é cada vez mais forte e não há nenhum sinal de que o regime mudará sua
postura agressiva, algo que considera necessário para sobreviver.
Nesta
terça-feira, os norte-coreanos comemoraram os 85 anos de suas Forças Armadas
com uma enorme demonstração de poder de fogo. De acordo com a agência estatal
de notícias KCNA, foi a maior manobra militar de todos os tempos, envolvendo
mais de 300 peças de artilharia de grande calibre e ataques de submarinos com
torpedos em maquetes de navios de guerra. A agência estatal afirmou que o
exercício demonstra a determinação do regime de "lançar uma impiedosa
chuva de fogo sobre o imprudente imperialismo americano e seus seguidores
sujos."
A
política externa americana mais agressiva e provocadora sob Trump eleva ainda
mais a tensão. Bem menos diplomático do que nesta semana, o líder americano
declarou em março que os EUA agiriam unilateralmente, se necessário, contra a
Coreia do Norte. Ele também insinuou que uma ação militar preventiva seria uma
opção para combater a produção de foguetes com ogivas nucleares capazes de
atingir os Estados Unidos.
Kim
e Trump
"A
diferença entre Trump e Kim Jong-un é que o presidente americano não tem nenhum
plano de longo prazo para a Coreia do Norte e nenhuma visão diferenciada de
quando, como, por que e por quanto tempo a força militar é útil ou
eficaz", afirma a especialista Katharine Moon, do Instituto Brookings.
"Kim tem um plano de longo prazo, que é a sobrevivência do regime, a
manutenção do orgulho nacional e a resistência aos EUA. Trump muda de ideia
toda hora, Kim não", diz Moon.
"As
pessoas fecharam os olhos por décadas, e agora é hora de resolver o
problema", declarou Trump numa reunião com embaixadores do Conselho de
Segurança das Nações Unidas para debater novas sanções à Coreia do Norte.
Na
última quarta-feira, os EUA anunciaram a instalação do controverso escudo
antimísseis Thaad numa área ao sul de Seul. Falando à Comissão de Forças
Armadas do Congresso, em Washington, o comandante das tropas americanas na
região da Ásia-Pacífico, o almirante Harry Harris, disse que o sistema estará
operacional em poucos dias.
Em
resposta às declarações ameaçadoras de Pyongyang, Harris também relatou que a
Coreia do Norte não teria nenhuma arma que pudesse ameaçar o USS Carl Vinson e
sua frota. "Se voar, será abatida", disse o almirante. Já o ministro
de Defesa da Coreia do Norte, Pak Yong-sik, declarou nesta segunda-feira,
durante um "encontro nacional" com a presença de milhares de
funcionários do governo, em Pyongyang, que o país usará ataques preventivos
para se defender, se necessário.
Mais
paciência estratégica será necessária
Apesar
das ameaças de uso de força, os EUA têm grandes dificuldades para agir
preventivamente, pois milhões de pessoas em Seul e arredores estão ao alcance
da artilharia convencional norte-coreana, que é simples, mas eficaz. "A
artilharia da Coreia do Norte poderia causar danos significativos em
Seul", diz Kelsey Davenport, diretora de Política de Não Proliferação na
Associação de Controle de Armas, em Washington. "O país possui uma série
de sistemas concentrados ao longo da zona desmilitarizada. Estima-se que o
número de peças de artilharia seja superior a 11 mil."
Davenport
acrescenta que, embora tais sistemas estejam envelhecendo e possuam uma alta
margem de erro, alguns poderiam atingir Seul – mais especificamente, lançadores
múltiplos de mísseis com calibre de 300 milímetros. De acordo com o think tank
americano de estratégia Stratfor, se todos forem disparados, um único ataque
poderia "lançar mais de 350 toneladas de explosivos sobre toda a capital sul-coreana,
aproximadamente a mesma quantidade lançada por 11 bombardeiros B-52."
"Pyongyang
não precisa de armas novas e sofisticadas para nos confrontar com o tipo de
risco que ninguém gostaria de correr. Os seus velhos armamentos ainda funcionam
bem", escreveu John Schilling, do think tank sobre a Coreia do Norte 38
North.
Nesta
sexta-feira, o secretário de Estado americano, Rex Tillerson, presidiu um
encontro do Conselho de Segurança das Nações Unidas para discutir a imposição
de sanções na Coreia do Norte. "A política da paciência estratégica
acabou", afirmou Tillerson. A maioria dos especialistas concorda com ele.
Ainda
assim, e apesar do tom duro do governo Trump, a atual ação dos EUA se assemelha
à estratégia de contenção, pressão diplomática e sanções que caracterizou por
décadas a cambaleante política americana frente para a Coreia do Norte.
Moon
afirma que uma estratégia ainda não testada seria isolar o regime norte-coreano
com sanções diplomáticas e mobilizar a Assembleia Geral da ONU para suspender a
participação da Coreia do Norte, o que restringiria o seu acesso e importância.
Influência
chinesa
Na
quarta-feira, Trump conversou com todos os senadores numa reunião sem
precedentes sobre a Coreia do Norte na Casa Branca e falou que o governo americano
vai contar com a influência econômica chinesa para pressionar o país vizinho.
Na quinta-feira, foi anunciado que os Estados Unidos vão endurecer as sanções a
Pyongyang.
"Até
agora, o reforço militar americano não faz parte de uma estratégia maior, assim
não está claro qual é o jogo final dos Estados Unidos", disse Moon,
acrescentando que o objetivo declarado é forçar a Coreia do Norte a desistir de
seu programa nuclear por meio de pressão econômica e militar. "Esse foi o
mesmo objetivo final dos governos de George W. Bush, Barack Obama e agora
Donald Trump", lembra a especialista. "O Carl Vinson não pode ficar
indefinidamente à porta da Coreia do Norte."
Imagens
de satélite de locais de testes nucleares da Coreia do Norte, analisadas no
início do mês pelo 38 North, mostram que a área de testes Punggye-ri
"parece pronta para realizar um sexto teste nuclear, a qualquer momento,
tão logo receba ordens de Pyongyang."
Por
enquanto, o nó norte-coreano segue difícil de desatar.
DW
- Deutsche Welle
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