O governo alemão implementou um projeto para controlar se as armas
exportadas pela Alemanha continuam nas mãos dos compradores ou se foram desviadas,
por exemplo, para grupos terroristas, como o "Estado Islâmico" e o
Boko Haram. O projeto de dois anos, porém, recebeu críticas de ativistas, já
que o controle está limitado aos países que aceitaram participar da fase
piloto.
O presidente da agência de controle de exportações (Bafa), Andreas
Obersteller, afirmou ao jornal Rheinische Post que sua agência está controlando
os chamados "países terceiros" – quer dizer, compradores de fora da
União Europeia e da Otan – e se concentrando na venda de pistolas e fuzis.
"Estamos verificando se as armas vendidas continuam em mãos do usuário
final", disse Obersteller.
O primeiro desses controles – e o único divulgado – foi feito na Índia há algumas semanas e envolveu a venda de 30 fuzis de precisão. As autoridades alemães confirmaram que as armas estão com quem deveriam estar. A Bafa afirmou que não pode dar detalhes de outros controles porque são "procedimentos em curso".
O teste piloto de dois anos faz parte de uma iniciativa de 2016 do então
ministro da Economia, Sigmar Gabriel, atualmente ministro do Exterior, que
anunciou a redução das exportações de armas como prioridade.
Mas essa meta não foi alcançada.
Ao contrário, as vendas aumentaram para níveis recordes durante o
mandato de Gabriel, atingindo o valor de 6,85 bilhões de euros. De acordo com o
instituto sueco Sipri, a Alemanha é o quinto país que mais vende armas no
mundo.
Para onde vão as armas?
A proliferação de armas, especialmente fuzis de assalto, alimenta
conflitos em todo o mundo, e armas produzidas na Alemanha caíram nas mãos de
praticamente todos os grupos terroristas e milícias que surgiram nos últimos 60
anos, entre eles o "Estado Islâmico" e o Boko Haram.
"O princípio é totalmente correto: se você exporta armas, deve
verificar para quem está vendendo", afirmou Jan van Aken, deputado do
partido A Esquerda e ativista contra a exportação de armas. "Mas isso só
faz sentido se você impor controles aleatórios – e em quem quer que seja."
Ele criticou que o controle está limitado aos países que concordaram em
participar do projeto. "E o governo não nos informou quais países deram
consentimento e sob quais condições", disse. "Se é feito somente nos
países que concordaram, então é pura fachada."
Segundo ele, o governo poderia facilmente forçar as fabricantes a
incluir essa condição em todos os contratos de vendas de armas simplesmente se
recusando a aprovar negócios que não incluam os controles aleatórios. E seria
também muito fácil impor sanções: se um país não puder localizar uma arma
comprada anteriormente, ele não receberá mais nenhuma.
Jürgen Grässlin, porta-voz da campanha contra a venda de armas Aktion
Aufschrei – Stoppt den Waffenhandel! (Ação de protesto – interrompam o comércio
de armas!), afirmou que a necessidade de os compradores concordarem com os
controles é o ponto fraco do projeto do governo. "De nada valerá o
controle se eles não mudarem isso", disse.
EUA e Israel verificam melhor o destino
Grässlin afirmou ainda que Estados Unidos e Israel já incluem a cláusula
do controle posterior em seus contratos de venda de armas. "Ao contrário
da Alemanha, israelenses e americanos verificam o destino de suas armas",
disse. Eles enviam representantes do Ministério da Defesa aos países
compradores e conferem se os estoques ainda estão lá.
O ativista também criticou os procedimentos adotados pela Alemanha, como
as "declarações de uso" – uma promessa que os compradores devem
assinar para garantir que as armas permanecerão nas mãos de quem deveria –,
afirmando que "não valem o papel onde foram impressas".
"Todos pegam o papel e assinam com um sorriso no rosto, pois sabem
que não terão de cumprir essa cláusula", acrescentou.
Ele citou como exemplo a Turquia, que vendeu metralhadoras MP5 para
países do Oriente Médio e a Indonésia. De acordo com os princípios de controle
de exportações do governo alemão, mais nenhuma arma poderia ter sido vendida
para a Turquia até que uma investigação sobre como isso aconteceu estivesse
concluída. Mas o caso nem sequer foi investigado.
No final da década de 1970, a fabricante alemã de armas Heckler&Koch
vendeu à Arábia Saudita a licença para fabricar os fuzis de assalto G3 – na
época o rifle padrão do Exército alemão –, e Riad prontamente comercializou as
armas na guerra civil da Somália. "Eles não tinham permissão para fazer
isso", afirmou Grässlin. "Eles deveriam perguntar ao governo alemão
se poderiam vender essas armas ou não. E Berlim teria dito não. Mas, em vez de
punir a Arábia Saudita, o governo alemão concordou em vender também, em 2008, a
licença para a produção do fuzil G36."
DW - Deutsche Welle
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